Tributação dos mais ricos é fundamental para reduzir desigualdades

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Seis brasileiros possuem uma riqueza equivalente ao patrimônio dos 100 milhões mais pobres do país, enquanto os 5% mais ricos detêm a mesma fatia de renda dos demais 95%. Os dados divulgados pela Oxfam Brasil evidenciam a extrema desigualdade que marca o país e os enormes desafios para superá-la. O assunto foi discutido no painel “Tributação da Renda e da Riqueza: A Experiência Internacional e o Brasil”, realizado na manhã desta terça-feira (29), durante o 3º Fórum Internacional Tributário (FIT), evento realizado em Brasília pelo Sindifisco Nacional, Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip), Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco), Federação Nacional dos Auditores e Fiscais de Tributos Municipais (Fenafim) e Comitê Nacional dos Secretários da Fazenda dos Estados e do DF (Comsefaz).

Sob a coordenação de Kátia Maia, diretora da Oxfam Brasil, o painel teve a participação de Morris Pearl, presidente da organização Patriotas Milionários; Clara Mattei, professora de Economia na The New School for Social Research, em Nova Iorque; Amitabh Behar, diretor da Oxfam Internacional; e Robinson Barreirinhas, secretário especial da Receita Federal. Morris Pearl destacou a enorme expectativa em torno da liderança do Brasil no G20 em 2024, quando será possível pautar acordos internacionais que garantam políticas tributárias mais justas, que promovam a tributação dos mais ricos, reduzindo desigualdades em escala global.

A Patriotas Milionários tem como objetivo aumentar a pressão sobre os políticos americanos para que aprovem mais tributos sobre a renda e o patrimônio dos super-ricos. “Deveria ser intuitivo quem ganha mais, paga mais”, disse Morris Pearl, para quem as desigualdades econômicas têm o poder de desestabilizar democracias, daí a importância de reformas tributárias que promovam justiça social. “Nós queremos essa reforma, só precisamos de força política”.

Autora do livro “The Capital Order: How Economists Invented Austerity and Paved the Way to Fascism”, ainda sem lançamento no Brasil, Clara Mattei demonstrou que existe uma relação direta entre e austeridade econômica e fascismo. “Quando se trata de austeridade fiscal, por exemplo, o que está em jogo não é apenas quanto o Estado gasta ou ganha em tributação, mas onde o Estado gasta e quem é tributado”, explicou.

A austeridade nos gastos sociais se contrapõe ao incentivo dado a determinados setores, da mesma forma que a tributação excessiva do consumo beneficia apenas uma pequena faixa da população. Nesse caso, a austeridade como política de governo serve para preservar a ordem do capital, garantindo que as pessoas mais vulneráveis aceitem trabalhos cada vez mais precarizados em troca de um salário que atenda somente à obtenção de bens de consumo básicos à sobrevivência. “A austeridade trabalha para enfraquecer quem está na base da sociedade e incentiva aqueles que estão no topo”.

Mattei fez um apanhado histórico para demonstrar que em 1920 a austeridade emergiu como instrumento para se contrapor aos trabalhadores mobilizados na Europa Oriental, no Reino Unido e na Itália, e como a política econômica forjada no Banco da Inglaterra forneceu a base para o fascismo de Mussolini – uma “coincidência” que se perpetua até os dias atuais. “Nosso sistema não é compatível com a democracia, a não ser que as pessoas participem das decisões econômicas”.

Os relatórios anuais publicados pela Oxfam demonstram que a desigualdade tem alcançado índices alarmantes a cada ano, alertou Amitabh Behar. “Em Bombaim temos o segundo edifício mais caro do mundo, com 27 andares para cinco pessoas. A 20 km distância vivem 100 mil pessoas sem saneamento básico e sem abrigo. Isso é um sinal de fracasso do sistema econômico que criamos”, afirmou, acrescentando que a pandemia de Covid-19 agravou o quadro, aumentando mais ainda a concentração de riqueza nas mãos dos 5% mais ricos.

Na avaliação de Behar, as profundas desigualdades levarão a uma erosão completa das instituições democráticas. “Essa é uma escolha política. A desigualdade não é inevitável”, afirmou, elencando ações que devem ser efetivadas em nível global, como tributação dos ricos, investimentos em serviços públicos essenciais, combate à crise climática e salário digno para todos. Behar finalizou sua palestra reiterando que o governo brasileiro precisar exercer a liderança mundial, a partir do G20, para promover a tributação progressiva e a luta pela redução das desigualdades.

Na avaliação de Robinson Barreirinhas, o debate acerca de um sistema tributário que promova justiça fiscal e social é fundamental para a democracia. Esse “movimento de conhecimento” representa um avanço importante, no momento em que governo e parlamento discutem a reforma tributária. Ele criticou a regressividade do sistema atual, que incide principalmente sobre a classe média e os mais pobres.

Barreirinhas afirmou que as alterações tributárias em discussão hoje não representam a tributação sobre grandes fortunas, mas tão somente a correção de distorções para que se alcance o básico em termos de justiça fiscal, ou seja, que cada um pague conforme a sua capacidade de pagamento. Ele citou um estudo recente realizado pelo Sindifisco Nacional que demonstra, a partir de dados da própria Receita, que no Brasil um professor paga mais imposto do que um milionário. O secretário da Receita observou que os dispositivos da reforma tributária ainda estão em debate e convocou os participantes, como servidores públicos, a trabalharem no sentido de contribuir para a redução das desigualdades.